Apresentamos o Convidado Internacional do XXVI Congresso Internacional de Acupuntura e IV Congresso de Dor do CMBA Dr Eduardo Francisco (Portugal).
CMBA – Quem é Eduardo Francisco? Fale um pouco de você fora do ambiente de trabalho médico.
Dr. Eduardo – Sou um cidadão socialmente muito activo, defensor duma utopia liberal clássica humanista, não neo-liberal. Pai de 2 filhos, 30 e 27 anos. Muito dedicado à sua Unidade de Saúde Familiar e acérrimo defensor dum Serviço Nacional de Saúde de excelência, tendo mesmo privado com o seu “pai político”, Dr. António Arnaut. Saudávelmente fustrado por não conseguir disponibilidade para praticar Aikido com regularidade !
CMBA – Como a Acupuntura surgiu na sua vida e qual o significado dela hoje?
Dr. Eduardo – O interesse pela acupunctura surgiu aos 15 anos com a observação dum tratamento bem sucessido realizado pelo meu mestre de Judo, na altura.
Ao longo da Faculdade fui cultivando com leituras, e em 1992 tive oportunidade de iniciar formação em MTC. É hoje uma arma terapêutica indispensável na minha prática clínica, apesar de muito condicionado pelo tempo disponível.
CMBA – Como você vê o atual momento da acupuntura na Europa e no mundo?
Dr. Eduardo – Controverso em duas vertentes:
– Interna, interpares, pelas acusações de “pseudociência” por parte de colegas fundamentalistas da MBE com o contributo de alguns colegas que entram por campos “quasi-esotéricos” e que contribuem para alimentar este clima.
– Externa, pelas sucessivas tentativas por “não médicos” de retirar a Acupunctura do âmbito do Acto Médico. A sociedade tem sido permissiva e a falta de conhecimento e coesão médica, e a própria participação de médicos na formação de “não médicos”, contribuiu muito para o insucesso da nossa luta. Em Portugal foi já regulamentada a prática da Acupunctura por “não médicos”, em contexto MTC, como Terapias Complementares. É um assunto que espero abordar na minha intervenção prevista para o Congresso da CMBA.
A própria população fica confusa, não percebendo a diferença entre Acupunctura Médica (AM) e acupunctura realizada por “não médicos”.
CMBA – Como você vê a participação atual do CMBA e suas lideranças no movimento de valorização da acupuntura mundial sob o ponto de vista político e científico?
Dr. Eduardo – Sob o ponto de vista político não me pronuncio ! O Brasil é demasiado importante, e pró-activo, e nunca poderá ficar à margem no contexto das organizações internacionais.
Sob o ponto de vista científico, é inegável a riqueza em qualidade de técnicos e investigação científica e o enorme potencial que a Acupunctura Médica tem no Brasil. Os associados da SPMA têm tirado partido dessa riqueza, pela enorme qualidade das formações oferecidas, e contamos num futuro bem próximo melhorar a qualidade da formação dos médicos portugueses através das parcerias que estamos a procurar desenvolver.
CMBA – Você acha que no seu país está ocorrendo um movimento de conscientização dos colegas de outras especialidades para que vejam a acupuntura como um ato médico?
Dr. Eduardo – Não é fácil responder a esta questão numa altura em que a pandemia, e agora a guerra, ainda estão a perturbar o regresso à normalidade. Penso que o grande factor decisivo na mudança de mentalidades tem a ver com o investimento na qualidade e modernização da formação em Acupunctura e, muito importante, na prática e divulgação dessa prática. Temos um sério problema de ter muitos médicos com formação mas que não praticam, o que é desmotivador para os próprios formadores, e uma perda de oportunidade para o progresso da AM.
CMBA – Existem serviços públicos de acupuntura em seu país? Como se dá o atendimento de pacientes de seguradoras, setor público, clientela particular e dentro das universidades?
Dr. Eduardo – Existem vários Serviços do SNS com médicos a utilizar a acupuntura, usualmente em contexto de consulta de medicina da Dor. Algumas seguradoras comparticipam, mas temos o problema de tenderem a não discriminar a acupuntura realizada por médicos, dada a força do lobby das Terapias Complementares. A formação nas Universidades tem estado estagnada nos últimos anos e estamos agora a procurar recuperar o atraso.
CMBA – O que você espera encontrar no Congresso Internacional do CMBA no próximo mês de outubro?
Dr. Eduardo – Inovação, motivação, unanimidade no enfrentar dos desafios e, como não poderia deixar de ser, boa disposição e cumplicidade entre colegas.
CMBA – Deixe seu recado aos nossos associados.
Dr. Eduardo – Os verdadeiros mestres são os nossos doentes e os algoritmos não se integram bem na relação médico-doente.
Cultivem na medicina uma filosofia de mente aberta (open mind) e procurem pensar com frequencia fora da caixa (out of the box).
Dr. Eduardo Francisco, Portugal, setembro de 2022.
(A entrevista foi publicada sem retoques do original em português).