Dor

O alívio da dor é um direito humano básico e negligenciá-lo parece moral e eticamente inaceitável. 

A partir dessa premissa, há um aumento da pressão social e da demanda pelos pacientes de uma melhora na qualidade da analgesia nas mais variadas síndromes dolorosas. 

Nas últimas décadas, verificamos um grande interesse e um progresso muito importante na área de dor. São variados os motivos: aumento, em geral, na sobrevida da humanidade, aumento da sobrevida em relação aos traumas e em relação às doenças.

 Tomando como exemplo os casos de Câncer, a Organização Mundial de Saúde (OMS) mostra números aproximados de 10 a 17 milhões de novos casos / ano no mundo. Desses, aproximadamente 50% irão a óbito. Cerca de 70% dos pacientes com câncer sofrerão de dores crônicas: 70%, de moderada a severa e 30%, terrível.

A OMS afirma que, se devidamente tratados, mais de 90% terão suas dores controladas. O relatório da OMS indica atendimento inadequado aos pacientes. 

Os motivos são vários, como desconhecimento pelos profissionais da saúde, inexistência de uma política para dor, falta ou dificuldades na obtenção de medicamentos opioides (ex. morfina) e receios e mitos sobre o seu uso, tanto por parte dos profissionais, como do paciente e família. 

Nitidamente, o que se verifica é uma grande precariedade global de educação em saúde com respeito à dor.

Não existem dados precisos para o Brasil, em relação a aspectos epidemiológicos da dor. 

No entanto, usados dados da literatura mundial. Admite-se a prevalência das dores crônicas em aproximadamente 30% da população em um país. Dados dos Estados Unidos mostram que 31% da população têm dor crônica, o que representaria 96 milhões de norte americanos convivendo com uma incapacidade total ou parcial para gerir a sua vida. 

Transpondo os dados mundiais para o Brasil, teríamos hoje no nosso país aproximadamente 60 milhões de pessoas com dores crônicas. Seguramente, uma queixa que se constitui em uma das maiores prevalências de doença em nosso país. Lembramos que as dores crônicas, por si sós, perdem a finalidade biológica de alarme, sendo assim consideradas como doença e não sintoma. 

É importante lembrar também, que um expressivo número de pacientes que evoluem cronicamente com dor acabam desenvolvendo disfunções emocionais como ansiedade generalizada, depressão e pânico, o que lhes gera sofrimento adicional, incremento da procura por atendimento médico, maior uso de medicamentos e aumento de gastos para o sistema de saúde de estados e municípios.

Dados também indicam que um bom número de pacientes que regularmente procuram os serviços de pronto atendimento é representado por portadores de dores crônicas mal tratadas, o que certamente poderia ser evitado caso lhes fosse oferecido um tratamento adequado.

O sofrimento causado pela dor não tratada adequadamente é considerado pela Organização Mundial de Saúde um grande problema de Saúde Pública. Muitos esforços têm sido feitos em todo o mundo, através da Sociedade Internacional Para o Estudo da Dor (IASP- que funciona como órgão consultor da Organização Mundial de Saúde, no que se refere a políticas da dor) e suas federadas (no Brasil, a Sociedade Brasileira Para o Estudo da Dor-SBED) junto aos governos para a criação e estabelecimento de programas educativos e ações específicas para o alívio da dor conduzidos por especialistas na área.

O Ministério da Saúde do governo brasileiro, através da Portaria GM/MS n˚ 19, de 03 de janeiro de 2002, instituiu, no âmbito do Sistema único de Saúde-SUS, o Programa Nacional de Assistência à Dor e Cuidados Paliativos, e, com a Portaria n˚ 1.319, de 23 de julho de 2002, criou os Centros de Referência em Tratamento da Dor Crônica, com objetivo de assegurar aos portadores de dor todos os direitos de cidadania, de defesa de sua dignidade, de seu bem-estar, direito à vida e acesso ao tratamento. 

Além disso, a boa assistência à dor resulta na racionalização do uso de medicamentos e de visitas ao sistema de saúde, na redução das incapacidades e do absenteísmo, decorrentes da dor; resulta ainda na melhor utilização dos recursos públicos envolvidos na assistência à saúde e diminuição dos gastos relacionados às repercussões psicossociais e econômicas decorrentes da inadequada abordagem dos pacientes com dor.

Um aspecto adicional importante é a taxa de ocupação de leitos hospitalares, especialmente leitos de hospitais oncológicos, por pacientes terminais ou sem expectativa de tratamento curativo, cuja permanência deve-se à dificuldade de ser estabelecida uma terapêutica antiálgica e paliativa domiciliar, gerando alentecimento do rodízio de leitos para novos casos e onerando os custos.